Fundamentos de Aquisição da Linguagem

Ronaldo Lima Jr.

Universidade de Brasília (UnB)

Teorias de Aquisição de segunda língua

Behaviorismo

Behaviorismo

A visão behaviorista de aquisição de L2 compartilha dos mesmos princípios de sua visão de aquisição de L1:

  • Aquisição de segunda língua ocorre por meio da criação de hábitos, através da imitação/repetição e de estímulos e reforços
  • Estímulo-Resposta: A aprendizagem ocorre por associação de estímulos externos com respostas desejadas
  • Reforço: Reforçar respostas corretas aumenta a probabilidade de sua repetição

Behaviorismo

As críticas também foram as mesmas:

  • Reducionismo: A abordagem simplifica a complexidade da aquisição de linguagem
  • Ignora Processos Mentais: Não leva em consideração a compreensão interna e processos cognitivos envolvidos na aprendizagem de uma língua

Aplicação ao ensino de L2

O behaviorismo aplicado ao ensino de L2 fez surgir um método de ensino chamada de Método Audiolingal, também conhecido como Army Method

  • Surgiu nos EUA durante a década de 1950, influenciado por teorias behavioristas e por encomenda das formças armadas durante a Guerra Fria
  • O enfoque era no desenvolvimento das habilidades auditivas e orais
  • Fazia uso intensivo de repetição (drills) para reforçar estruturas linguística e para automatizar respostas corretas
  • Estudantes imitavam modelos nativos para desenvolver pronúncia “correta/autêntica”, e memorizavam diálogos e frases para promover fluência

Críticas

  • Foco excessivo em padrões específicos pode limitar a habilidade dos alunos de se adaptarem a diversas situações linguísticas
  • Pouca Ênfase em produção e compreensão escrita
  • Ênfase excessiva em diálogos pré-fabricados, sem espaço para personalização da aprendizagem, uso genuíno da comunicação, e contextualização de acordo com as necessidades dos aprendizes

Exemplo

Inatismo

Inatismo

  • Trata-se da aplicação do Inatismo proposto por Chomsky para aquisição de L1 à aquisição de L2
  • Muitas pesquisas buscaram verificar a existência de uma Gramática Universal (GU) na aquisição de L2
  • Sua aplicação ao ensino de L2 se deu pela proposta do Modelo Monitor, de Stephen Krashen (1978), composto por 5 hipóteses

Modelo Monitor

  1. Hipótese da Aquisição x Aprendizagem:
    • Aquisição: Processo natural e subconsciente de assimilar a linguagem através da exposição (gerando conhecimento implícito)
    • Aprendizagem: Processo consciente de compreender e aplicar regras gramaticais (gerando conhecimento explícito)
    • A aquisição é a responsável para desenvolver fluência linguística em uma L2
    • Um falante só consegue acessar o sistema adquirido (conhecimento implícito) enquanto utiliza a L2
    • Um falante só consegue acessar o sistema aprendido (conhecimento explícito) quando tem tempo de parar para monitorar a sua língua
  1. Hipótese da Ordem Natural:
  • Krashen postula que aprendizes de uma L2 passarão pelas mesmas etapas de aprendizagem a despeito de suas L1s.
  1. Hipótese do Input:
    • O input compreensível, ou seja, a exposição à linguagem que é um pouco além do nível atual do aprendiz (i+1), é essencial para a aquisição efetiva
    • Input significativo é mais valioso do que instrução explícita
  1. Hipótese do Filtro Afetivo:
    • Fatores afetivos, como motivação, ansiedade e confiança, influenciam a eficácia da aquisição linguística, criando um filtro emocional que bloqueira o input, não permitindo que ele se torne intake
  1. Hipótese do Monitor:
    • O “Monitor” refere-se à capacidade de monitorar e corrigir a produção linguística
    • Ele só pode ser acessado quando se tem tempo para pensar sobre o conheicmento explícito

Críticas

  • Validade Empírica Limitada: as hipóteses do Modelo Monitor não podem ser testadas de maneira objetiva por meio de experimentos

  • Sobrevalorização da Aquisição Natural: a aprendizagem formal pode desempenhar um papel mais significativo em certos contextos ou para certos indivíduos

  • Falta de Atendimento à Diversidade Individual: O Modelo não aborda adequadamente as necessidades individuais – Alguns alunos podem se beneficiar mais de métodos mais formais ou estruturados.

  • Abordagem Passiva da Aprendizagem: o Modelo pode levar a uma abordagem passiva da aprendizagem, desconsiderando a importância da participação ativa e do envolvimento do aluno no processo de aprendizagem de línguas

Krashen ilustrando o Modelo

Hipótese do output

Proposta por Merrill Swain, não invalidava o papel do input, mas acreditava que input compreensível não era suficiente. Principais características:

  • Papel do Output na Aquisição: Swain destaca a importância da produção linguística – output – no processo de aquisição de segunda língua

  • Consciência na Produção: a hipótese sugere que a produção ativa de linguagem, especialmente ao tentar expressar conceitos complexos, leva a uma maior conscientização linguística

  • Geração de Hipóteses: ao produzir output, os aprendizes são desafiados a formular hipóteses linguísticas e a refletir sobre as estruturas da língua

  • Feedback Cognitivo: a produção de output permite que os aprendizes recebam feedback cognitivo sobre suas tentativas, facilitando a internalização de regras gramaticais e vocabulário

  • Papel da Comunicação: a hipótese destaca que a produção de output é essencial para a comunicação efetiva, especialmente em situações em que os aprendizes estão envolvidos em interações significativas

Aplicações Pedagógicas

  • Ênfase na Produção Ativa: recomenda a promoção de atividades que incentivem os alunos a produzir linguagem de maneira significativa, em vez de apenas receber input passivo

  • Atenção à Correção e Feedback: destaca a importância de fornecer feedback construtivo sobre a produção linguística dos alunos, permitindo que eles corrijam e aprimorem suas habilidades

  • Abordagem Centrada na Tarefa: pode apoiar abordagens centradas em tarefas, onde os alunos são desafiados a realizar atividades que envolvem a produção de output para alcançar objetivos específicos

(Socio)Interacionismo

Interacionismo

  • Hatch (1978): A aquisição não parte da estrutura para o discurso, mas do discurso para a estrutura.
    • Crianças com L1 e aprendizes de L2 têm uma necessidade comunicativa e usam estratégias múltiplas para alncaçar esse objetivo mesmo sem a estrutura impecável
  • Long (1980): importância do input + output – analisou intercações entre falantes nativos e não nativos e viu o grande uso de estratégias comunicativas de ambos para se alcançar o objetivo da comunicação
  • Papel do feedback afetivo e cognitivo
  • Papel da correção
  • Papel das estratégias comunicativas

Socio-interacionismo (Teoria Sociocultural)

Lantolf & Beckett (2009)

O funcionamento mental humano resulta da participação em e da apropriação de formas de mediação cultural integradas em atividades sociais

Lantolf & Thorne (2007)

Entende-se que os humanos utilizem artefatos culturais já existentes e criem novos que permitam regular suas atividades biológicas e comportamentais

Vygotsky

Principais teses

  • Não se pode separar o desenvolvimento da linguagem do contexto histórico e social
  • Os humanos pensam através da criação e do uso de ferramentas mediadoras
  • A linguagem tem papel importante no desenvolvimento mental, sendo ela a principal ferramenta de mediação
  • Mediação (interação, andaimes, ZDP)
  • Automediação (fala privada)

Interação humana na ASL

Conexionismo

Conexionismo

A perspectiva conexionista é uma abordagem teórica na aquisição de segunda língua que se baseia nos princípios da neurociência e em modelos computacionais inspirados no funcionamento do cérebro.

  1. Redes Neurais Artificiais (RNAs): A teoria conexionista utiliza modelos computacionais, como redes neurais artificiais, para simular o processo de aprendizagem de uma segunda língua. Essas redes consistem em unidades interconectadas que representam neurônios, e os pesos das conexões entre essas unidades são ajustados durante o processo de aprendizagem.
  1. Aprendizagem Distribuída: A perspectiva conexionista destaca a ideia de que o conhecimento linguístico é distribuído de maneira interconectada em toda a rede neural, em oposição à ideia de regras gramaticais isoladas. A aprendizagem ocorre por meio do ajuste contínuo dos pesos das conexões, com a informação sendo armazenada de maneira distribuída.
  1. Processo Gradual e Incremental: A aquisição de uma segunda língua é vista como um processo gradual e incremental, no qual os aprendizes acumulam conhecimento ao longo do tempo. A exposição constante à língua-alvo leva a ajustes contínuos nas conexões neurais, resultando em melhorias na proficiência linguística.
  1. Influência da Experiência: A teoria conexionista destaca a importância da experiência na aprendizagem de uma segunda língua. A exposição a diferentes contextos linguísticos e a prática constante são fatores cruciais para o desenvolvimento linguístico.
  1. Generalização e Flexibilidade: As redes neurais conexionistas são capazes de generalizar padrões aprendidos para novas situações, proporcionando flexibilidade na aplicação do conhecimento linguístico. Isso reflete a capacidade dos aprendizes de adaptar seu conhecimento a uma variedade de contextos linguísticos.

Redes Neurais Artificiais

Aplicações para a sala de aula

  • Importância de equilibrar input e output (exposição e produção)
  • Testar hipóteses e obter feedback
  • Practicar, revisar, avançar a voltar –> ensino cíclico
  • Se a aquisição é estocástica, é preciso reforçar na sala de aula os aspectos mais importantes

Modelo de Aculturação

Para pensar:

  • Por que se diz que língua e cultura são interconectadas? Consegue pensar em exemplos?
  • É preciso gostar/admirar a cultura da L2 para poder adquirir a L2? Ajuda? Por quê (não)?
  • Qual cultura um aprendiz de inglês-L2 deve aprender ao estudar inglês?
  • Qual cultura um aprendiz de português-L2 deve aprender ao estudar português?

Para pensar:

  • Consegue pensar em exemplos culturais do Brasil fortemente conectados a língua e que podem ser explorados em sala de aula de português-L2?

Modelo de Aculturação

Aprender uma nova língua não é apenas adquirir novas formas linguísticas, mas também envolve a compreensão e incorporação da cultura associada a essa língua. Principais pontos:

  1. Integração Cultural: A aculturação destaca a importância de se integrar à cultura da língua-alvo. Isso inclui compreender normas sociais, valores, tradições e comportamentos típicos da comunidade que fala a língua que está sendo aprendida.
  1. Contextualização Social: A aprendizagem da língua é vista como parte de um processo social mais amplo. Interagir com falantes nativos e participar de atividades culturais são considerados aspectos essenciais para o desenvolvimento da proficiência na língua.
  1. Adaptação Cultural: Os aprendizes de segunda língua são incentivados a se adaptar culturalmente, o que pode envolver mudanças na maneira de pensar, comportar-se e se comunicar. Isso contribui para uma comunicação mais eficaz e autêntica na nova língua.
  1. Consciência Intercultural: A consciência intercultural é um componente fundamental, pois os aprendizes são encorajados a compreender e apreciar as diferenças culturais entre sua língua nativa e a língua que estão aprendendo. Isso ajuda a evitar mal-entendidos e promove uma comunicação mais eficaz.
  1. Aprendizagem Integrada: O modelo da aculturação sugere que a aprendizagem da língua e da cultura devem ser integradas, em vez de separadas. Isso significa que as habilidades linguísticas são desenvolvidas em conjunto com a compreensão cultural para uma experiência de aprendizagem mais completa.

O Modelo da Aculturação (Acculturation Model) de John H. Schumann (1978):

  1. Fatores Afetivos e Sociais: Schumann destaca a importância de fatores afetivos e sociais na aquisição de uma segunda língua. Ele sugere que atitudes emocionais e interações sociais influenciam significativamente o processo de aprendizagem.
  1. Aculturação: O termo “aculturação” refere-se à integração do aprendiz na comunidade que fala a segunda língua. Schumann argumenta que quanto mais o aprendiz se acultura à comunidade-alvo, maior será a probabilidade de sucesso na aquisição da língua.
  1. Variáveis de Aculturação: Schumann identifica três variáveis principais que afetam a aculturação e, por conseguinte, a aquisição da segunda língua:
    • Motivação: A motivação do aprendiz para se integrar à comunidade falante da segunda língua.
    • Autoconfiança/Ansiedade: O nível de confiança ou ansiedade experimentado pelo aprendiz ao se comunicar na segunda língua.
    • Adaptação Social: A habilidade do aprendiz de se adaptar socialmente à comunidade-alvo.
  1. Períodos Críticos: Schumann sugere que existe um “período crítico” durante o qual a aculturação é mais eficaz. Durante esse período, os aprendizes têm uma maior probabilidade de desenvolver proficiência linguística.
  1. Saída Linguística: Schumann destaca a importância da “saída linguística”, ou seja, a produção ativa da língua-alvo. Ele argumenta que os aprendizes que se envolvem ativamente na comunicação têm maior probabilidade de se aculturar e, portanto, adquirir a língua com sucesso.

Exemplo de pesquisa

Críticas

  • Não se trata de uma Teoria que abarque a aquisição como um todo, mas de um Modelo que vislumbra acerca de um (importante) aspecto do desenvolvimento de uma nova língua.

Dinamicismo / Teoria da Complexidade

Teoria de Sistemas Dinâmicos Complexos

Trata-se de uma Teoria geral (não específica de uma área do conhecimento) que busca explicar e modelar o comportamento de sistemas da natureza que são, entre outras características:

  • complexos
  • dinâmicos
  • não lineares

Teoria de Sistemas Dinâmicos Complexos

  • adaptativos
  • auto-organizadores
  • sensíveis a estados iniciais
  • estados atratores
  • emergente
  • fractal

Outros tópicos

  • Fatores individuais
  • Feedback e correção de erros
  • Interlíngua